Tati Quebra Barraco fez turnê na Europa com seu funk "nervosão" patrocinada pelo MIC
Para quem não sabe a Lei Rouanet é destinada a promover e estimular a regionalização da produção cultural e artística brasileira, com valorização de recursos humanos e conteúdos locais. Ela permite o perdão fiscal para empresas desde que o recurso seja aplicado na produção cultural. Mas o que sabemos é que os incentivos arrecadados através da Lei não atingem a sua finalidade, sem antes atender, interesses das empresas investidoras com ganhos na mídia (assinatura) agregados ao produto cultural; atender aos interesses dos órgãos (bancos, estatais, outros) autorizados pelo governo a repassar os recursos, e repassam primeiro em benefício de seus próprios institutos, centros culturais ou fundações de arte.
Paradoxalmente, também o poder público se beneficia, o que é muito estranho, já que o Estado é o ordenador dessa política e para tal, abre até seleção pública, em todo o território brasileiro. Entretanto, isentos de qualquer concorrência, projetos do próprio ministério da cultura, secretarias estaduais e municipais comem parte significativa dos recursos Lei Rouanet aplicados em museus, bibliotecas, fundações, realização de festivais, mostras, carnavais fora e dentro de época, viagens de artistas, comissões de gestores, assessores, representações e artistas, produções de filmes sem nenhum critério com a qualidade, tour de artistas na Europa, entre outros eventos.
O sociólogo e ensaísta Carlos Alberto Dória e autor de Os Federais da Cultura, em seu artigo - É chato dizer, mas a Lei Rouanet fracassou -, afirma: “Ora, num país onde as leis costumam “pegar” ou “não pegar”, a Lei Rouanet inaugura uma nova modalidade: a das leis que “pegam” e fracassam. Ela não fracassou por falta de adesão, mas por excesso de adesão interesseira, contemplando apenas a perspectiva dos ganhos econômico-financeiros que promete”. Um bom exemplo disso é fato - quase a metade do investimento inicial de R$ 11 milhões da produção inglesa, o Fantasma da Ópera”, que veio ao Brasil (versão em português), possibilitado através da Lei Rouanet, trocando em miúdos: verba pública beneficiando interesses de empresas estrangeiras.
O conceituado maestro John Neschling quando da dificuldade em conseguir investidores para ópera O Anel, de Wagner, declarou: “A Lei Rouanet é ridícula, uma perversidade. Essa lei existe para que Itaú, Bradesco e Banco do Brasil possam investir neles mesmos, fazer seus centros culturais e pagar seus ascensoristas”. Mas, tanto os generosos benefícios fiscais como os débeis investimentos no apoio a pequenos projetos, torna seus usuários fregueses, presos a um esquema que de cara, descaracteriza o conceito do que chamamos de incentivo.
Como justificar que Lei (federal) patrocina centros culturais de bancos, estatais, prefeituras, estados e o próprio governo federal.
As migalhas, então, são disputadas a “ferro e fogo” entre pequenos projetos, (independentes ou comunitários), submetidos a editais, aparentemente democráticos, produtores culturais dos confins do Brasil possibilitadas por atravessadores, lobistas e, quando contempladas, o que resta do incentivo cultural depois do saque em comissões e impostos (que volta para o governo – aquele que diz incentivar a cultura) mal cobre as despesas básicas de seus projetos e pior, sem possibilidade de sustentação.
Como entender a permanência de uma Lei, sob a tutela do Ministério da Cultura, tão insensata e danosa. É necessário compreender também seus méritos. Os incentivos fiscais para o setor cultural injetam no país milhões ao ano, somadas as legislações federais, estaduais e municipais, descontada a parte que escorre pelo ralo, das deduções e intermediações, chega o dinheiro na ponta do mercado. Criticá-la, sim, como fiz de forma ferrenha no programa cultural que o PT que apresentou para o governo de Lula, mas derrubá-la não, pois implicaria confrontar a cultura com outras áreas de interesse já que do mesmo couro saem todas as correias.